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Bernardo Simões de Almeida

Será o capitalismo sustentável?

6 May 2024 - 09:00
O site do FMI explica que o capitalismo é um sistema económico em que os meios de produção e propriedade pertencem ao setor privado, cuja motivação é o lucro e os preços de bens e serviços são regulados livremente, dentro da lei da oferta e procura. Independentemente das definições, aquilo que desde sempre parece mover o capitalismo é o interesse próprio, a acumulação e até o controlo. Porém, o capitalismo também pode fazer parte da solução, exemplos não faltam, haja vontade para isso.

No seu livro Pós-Capitalismo, um guia para o nosso futuro, o jornalista e professor britânico Paul Mason vai um pouco mais além e afirma que o capitalismo é um sistema demográfico, social, cultural e ideológico que inclui “redes secretas de poder, pregadores de milagres e analistas desonestos”.

O problema é que a procura do capital a todo o custo está a destruir o planeta. A competitividade entre empresas para exploração de recursos gera imensos desequilíbrios, destrói o meio-ambiente e aumenta a temperatura da Terra.

Essas consequências também têm custos. De acordo com um artigo escrito no site do Fórum Económico Mundial, as alterações climáticas, que são largamente provocadas pela ação humana, terão custos, por danos na agricultura, infraestruturas, e saúde humana, que ascenderão aos 3.1 trilhões de dólares até 2050, ou seja, 16 milhões por hora.

O problema é que a procura do capital a todo o custo está a destruir o planeta.

Se analisarmos o que está por detrás de fenómenos como o fast-fashion encontramos facilmente um dos motivadores do capitalismo. A mera ideia da compra e venda de roupa descartável, rapidamente substituída por outra igual que continua e perpetua este ciclo, apenas subsiste pelo capital acumulado vindo do consumo desenfreado, que, como é sabido, transforma esta indústria numa das mais poluentes e das que mais recursos naturais precisa. Prova disso é a atuação de empresas como a Zara e H&M que, de acordo com a Earthsight, contribuem para a desflorestação, apropriação de terra e corrupção na indústria do algodão brasilieira.

Outro exemplo deste comportamento galopante é o impacto da indústria alimentar. Se tivermos em conta todo o processo, que começa na produção de alimentos, transporte de mercadoria, armazenamento e lixo derivado, consegue-se facilmente entender como este ciclo causa inúmeros impactos ambientais. De acordo com o site climateseed, o setor da agricultura usa 70% da água potável global, ocupa metade da terra habitável e emite 26% de todas as emissões de C0².

E ainda há as consequências ambientais da produção de alimentos de proteína animal, como é o caso das criações de vacas para carne, que de acordo com o site Our World in Data, emite cerca de 9,48kg de CO², gasta 660L de água potável e ocupa 12.22m² de terra só para produzir um quilo.

A mera ideia da compra e venda de roupa descartável, rapidamente substituída por outra igual que continua e perpetua este ciclo, apenas subsiste pelo capital acumulado vindo do consumo desenfreado.

A juntar à acumulação de capital, independentemente das consequências ambientais, o capitalismo, ou seja, aqueles que efectivamente ganham dinheiro com a manutenção deste modelo, usam o controlo de informação para influenciar a propagação de narrativas.

Foi recentemente publicado pela Green E-Fact  que algumas empresas americanas da industria pecuária e dos lacticínios pagaram a instituições académicas para manipular os dados referentes aos impactos ambientais deste setor.

Isto sem falar nos combustíveis fosseis, na acidificação dos oceanos, nas doenças relacionadas com a alimentação pobre em nutrientes, e muitas outras situações causadas pela procura constante de acumulação de capital a qualquer custo.

Um exemplo mais ético é o modelo de negócio da empresa espanhola Mondragon, que opera em setores como a banca, o retalho ou a construção e tem como base uma estrutura cooperativa, sendo a maior empresa do mundo do género, com mais de 80 cooperativas e 70 mil empregados.

Porém, o capitalismo também pode fazer parte da solução ao financiar setores como o das energias renováveis. Aliás isso já acontece. Empresas como a americana General Electrics, que chegou aos 75 mil milhões de lucros no ano passado, e é considerada, a par da espanhola Iberdrola, com lucros acima dos 50 biliões de dólares, uma empresa líder no mercado das energias verdes.

Um outro exemplo mais ético é o modelo de negócio da empresa espanhola Mondragon, que opera em setores como a banca, o retalho ou a construção e tem como base uma estrutura cooperativa, sendo a maior empresa do mundo do género, com mais de 80 cooperativas e 70 mil empregados. Este modelo permite que todos os envolvidos tenham a sua palavra, o que resulta num maior equilíbrio de poder, mobilidade interna e controlo de possíveis fossos salariais numa ótica de “pessoas acima do capital”.

Recorde-se que em Portugal há empresas onde os lugares de topo ganham 260 vezes mais do que os trabalhadores, como é o caso da Jerónimo Martins, de acordo com o Jornal Eco. Por outro lado, também existem empresas cujas receitas estão diretamente ligadas ao conceito de economia circular como é o caso da shoeclinic, uma empresa que restaura sapatos e assim evita a obsolescência e o desperdício.

Em suma, o problema não está na falta de soluções nem o capitalismo está condenado a um eterno comportamento predador e insustentável. Todos os dias aparecem um pouco por todo o lado inovações e modelos que podem mudar o paradigma atual.

Será antes a resistência que certos setores oferecem ao progresso, como é o caso do petrolífero, entre outros. A esses é preciso perguntar em que mundo querem que as gerações vindouras gastem o seu dinheiro?