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Mariana Gomes

Conferência de Bona: duas mãos cheias de nada

16 Jun 2024 - 09:00
A 60.ª sessão dos órgãos subsidiários (SB60) da Convenção-Quadro da ONU sobre Alterações Climáticas (UNFCCC), realizada em Bonn (Alemanha), entre 3 e 13 de junho, marcou o início da história do acordo que mais tarde será altamente noticiado na COP29.

Comparada à COP28, as negociações ocorreram de forma mais estruturada, sem a confusão da Green Zone, das centenas de Pavilhões e eventos paralelos e com uma participação da sociedade civil muito mais reduzida – o que, a priori, poderia indicar uma maior apetência para a desburocratização e negociações rápidas. Mas não foi o que aconteceu.

Cerca de 6.000 participantes de quase 200 países reuniram-se para abordar assuntos como os Planos Nacionais de Mitigação (NDCs) e de Adaptação (NAPs), o Fundo de Perdas e Danos, a aceleração da ação climática através de uma transição justa, o artigo 6.º do Acordo de Paris (Mercados de Carbono) e o Quadro de Transparência. O financiamento climático, em particular a Nova Meta Quantificada Coletiva de Financiamento Climático (NCQG), ficará para ser decidido, quase na sua totalidade, na COP29, no Azerbaijão, tornando-se o “elefante da sala”.

Apesar das expectativas alicerçadas no resultado do Balanço Global da COP28 sobre financiamento climático, a SB60 representou o passo de caracol das negociações climáticas e uma omissão grave perante o compromisso informal para o abandono dos combustíveis fósseis. Voltamos para casa com duas mãos cheias de nada e duas cheias de tudo para o Azerbaijão.

O financiamento climático, em particular a Nova Meta Quantificada Coletiva de Financiamento Climático (NCQG), ficará para ser decidido, quase na sua totalidade, na COP29, no Azerbaijão, tornando-se o “elefante da sala”.

Os grandes acordos da SB60 disseram respeito à extensão dos textos apresentados para negociação, e à divisão estrutural entre as visões dos Países Desenvolvidos e dos Países em Desenvolvimento.

O modelo atual de negociações climáticas, conhecido como “Processo de Negociação Global”, tem-se demonstrado ineficaz, burocrático e dominado pelo Norte Global. Todos os anos, os negociadores reúnem-se para discutir e tomar decisões sobre a melhor forma de combater as alterações climáticas. Os instrumentos de trabalho para as negociações são os textos de negociação, baseados em propostas escritas apresentadas pelos governos. No final de uma negociação, o Presidente bate o martelo para declarar que foi adotada uma decisão ou um novo tratado. A COP é o órgão supremo de decisão do processo de alterações climáticas e caminhamos rumo à 29.ª.

O modelo atual de negociações climáticas, conhecido como “Processo de Negociação Global”, tem-se demonstrado ineficaz, burocrático e dominado pelo Norte Global.

A ineficiência torna-se ainda mais preocupante perante o aumento consecutivo, ano após ano, das emissões de gases de efeito estufa (GEE). Urge repensar o modelo tradicional de negociações e torná-lo mais eficiente, acessível e transparente à sociedade civil, garantindo um processo justo e equitativo que incorpore juridicamente as necessidades dos países na linha da frente.

No limite: torná-lo um verdadeiro órgão de Ação Climática, sob pena de virar o “dinossauro” na sala. Nada menos do que isso será suficiente para limitarmos a temperatura média do planeta a 1.5 ºC.

 

  • Presidente e Fundadora da Associação Último Recurso, a primeira ONG jovem a integrar a Delegação Portuguesa em Conferências da UNFCCC