Uma análise, publicada este mês na revista Science Advances, estima que os incêndios florestais na Califórnia entre 2008 e 2018 levaram a cerca de 52.500 a 55.700 mortes prematuras ao longo de 11 anos, o que equivale a um impacto económico de 432 a 456 mil milhões de dólares.
Divulgada um dia depois de um grande incêndio ter sido contido no norte da Califórnia, a pesquisa mostra que os efeitos das nuvens de fumo na saúde se fazem sentir não só nos primeiros dias de exposição, mas também anos depois.
A investigação usou um modelo matemático para avaliar o impacto a longo prazo do fumo na mortalidade da população. Os resultados indicam que a poluição por partículas finas libertadas pelos incêndios – conhecidas como PM2.5 – é prejudicial à saúde. Estas partículas, com um diâmetro inferior a 2,5 micrómetros, podem penetrar nos pulmões e até entrar na corrente sanguínea, danificando os sistemas cardiovascular e respiratório.
O estudo publicado na revista Science Advances mostra que os efeitos das nuvens de fumo dos incêndios florestais na saúde continuam a fazer sentir-se vários anos depois.
Em entrevista ao Green eFact, Ediclê Duarte, especialista em Ciências Atmosféricas e Climáticas com foco na qualidade do ar, diz que a descoberta é “alarmante”, sobretudo num “cenário de alterações climáticas”.
O investigador clarifica ainda o conceito de mortes prematuras, explicando que as “pessoas podem morrer mais cedo do que o esperado devido a essas condições”.
“A exposição prolongada ao fumo de incêndios florestais pode agravar doenças respiratórias, como asma e doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC), e pode levar a problemas cardiovasculares graves, como ataques cardíacos e acidentes vasculares cerebrais. Em casos extremos, essas complicações podem ser fatais,” reitera o especialista.
Ediclê Duarte é o autor principal de outro estudo, publicado em 2023 na revista GeoHealth, que também abordou os efeitos dos incêndios florestais na saúde. A análise incidiu sobre a temporada de incêndios em Portugal entre 2011 e 2020 e encontrou ligações entre a exposição ao fumo e o aumento da mortalidade.
“Descobrimos que os meses mais quentes, secos e poluídos do período de incêndios estavam fortemente associados a um aumento na mortalidade por doenças cardiorrespiratórias”, diz o investigador.
Outro estudo, publicado em 2023 na revista GeoHealth, incidiu sobre a temporada de incêndios em Portugal entre 2011 e 2020 e encontrou ligações entre a exposição ao fumo e o aumento da mortalidade.
De acordo com Ediclê Duarte, esse “resultado estatisticamente significativo” foi evidenciado pela presença de poluentes como partículas finas (PM10 e PM2.5), monóxido de carbono (CO) e ozono (O3), aliada a condições meteorológicas como temperaturas elevadas e baixa humidade relativa.
Segundo o investigador, ao avaliar os riscos dos incêndios para a saúde pública, é importante considerar não só a intensidade dos fogos, mas também a qualidade do ar e as condições meteorológicas.
“Essas descobertas são importantes para orientar políticas públicas voltadas para a mitigação dos impactos dos incêndios florestais, destacando a necessidade de estratégias que aumentem a resiliência das comunidades expostas a esses eventos ambientais extremos.”
Os seniores, grávidas e populações socioeconómicas desfavorecidas são particularmente suscetíveis aos riscos associados aos incêndios, adianta Ediclê Duarte. Numa altura em que a temporada de incêndios se aproxima, importa tomar “medidas preventivas conforme orientadas pelo IPMA e pelo SNS24”, refere o investigador.
Os seniores, grávidas e populações socioeconómicas desfavorecidas são particularmente suscetíveis aos riscos associados aos incêndios, adianta o investigador Ediclê Duarte.
Ediclê Duarte apela a que as pessoas estejam atentas aos alertas meteorológicos emitidos por essas instituições e deixa outros conselhos, como respeitar as proibições de queima, manter áreas ao redor das casas limpas de vegetação inflamável e evitar exercício físico ao ar livre em períodos de muito calor e baixa qualidade do ar.
“Essas precauções não apenas protegem indivíduos e propriedades, mas também contribuem para a segurança coletiva durante períodos de alto risco de incêndios,” explica.
O especialista defende ainda um “entendimento partilhado dos efeitos dos incêndios na saúde e no meio ambiente” para melhor combater os efeitos das alterações climáticas e avisa que incêndios florestais vão ser cada vez mais frequentes.
“A frequência crescente dos incêndios florestais e as previsões de que esses eventos se tornarão mais comuns exigem ações climáticas urgentes para mitigar os impactos das alterações climáticas no meio ambiente e na saúde pública,” refere.