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Isabel Lindim

Dinis, o “mini-biólogo”: “faço estes vídeos para mostrar às pessoas que a natureza não é má”

1 Jun 2024 - 09:00
Foi uma conversa realizada no intervalo de uma exploração do Dinis e do pai (Nelson), em busca de animais. Aos onze anos, este “mini-biólogo” é sem dúvida uma fonte de conhecimento, como tão bem sabem as mais de 50 mil pessoas que o seguem no Instagram. Mas não só. É também uma criança cheia de vontade de comunicar e transmitir ao mundo como é importante proteger os animais.

Dinis: Saímos agora de uma casa abandonada, onde vi uma cobra de 2 metros. Levantei uma telha e vi a ponta de uma cauda. Era uma rateira!

 

Onde é que foram ver isso? 

Dinis: Estamos aqui na zona de Mindelo. Aquilo deve ser tipo uma chance em 10 anos. É uma cobra enorme.

Nelson: Para o próximo ano o Dinis está a fazer uma colaboração com a Leya num projeto de ciências, no qual vai ter dois vídeos. Vai aparecer no manual digital da Leya. Um deles já fizemos, que é do sardão.

Dinis: Tenho mesmo de ir encontrar aquela cobra. A última vez que vim aqui, falhei, foi para o meio do mato. Esta aqui é só levar para um canivete e cortar umas silvas, ela está agora debaixo de um monte de telhas. Não saio daqui sem ver a cobra.

 

E encontraram mais alguma cobra hoje? 

Nelson: Não, só uma cobra de pernas.

Dinis: Pai, é um lagarto.

Nelson: Sim, está bem.

Dinis: Vamos ao assunto.

 

Quando queres encontrar um animal, escolhes um certo tipo de ecossistemas. Hoje, por exemplo, qual foi? 

Dinis: Normalmente vou a montes ou praias. Isto aqui não é bem um monte, é uma reserva junto à praia. Tem muita área verde. As cobras rateiras, por exemplo, gostam de todo tipo de habitats, quase. São os sardões em versão cobra, percebes?

 

É um predador de topo.

Nelson: Há umas águias que as comem…

Dinis: Dois metros, pai? Qual é a águia que come uma cobra de dois metros?

Elas gostam de estar nestes habitats principalmente, que é tipo duna, e em casas abandonadas. Ou seja, com muita vegetação para elas se esconderem nas silvas, que são as suas plantas favoritas. São as maiores cobras da Europa.

Por acaso até são venenosas, mas o seu veneno, como são colubrídeos, não é mortal. Não é perigoso. É mais para paralisar ratos ou desinflar sapos. Esta cobra deve estar alimentada dos sapos que há aqui.

Desde muito cedo que Dinis, hoje com 11 anos, começou a percorrer o campo com o paiu, Nélson, à procura de animais.

Consegues explicar-me qual é a importância, por exemplo, destas cobras para o meio ambiente? 

Dinis: Normalmente as cobras ajudam muito a controlar pestes como os ratos. Em Nova Iorque, se introduzirem lá pitões, os ratos estão tramados. Aqui em Portugal elas não fazem muita coisa diferente do que costumam fazer nos outros países. Comem animais, as juvenis, principalmente. São muito importantes para a cadeia alimentar.

 

E sobre as salamandras, que é o maior anfíbio da Europa. O que podes dizer sobre estes animais? 

Dinis: O maior anfíbio que temos em Portugal, na Europa é o tritão de costelas salientes. Chama-se salamandra de costelas salientes, mas é um tritão.

Nelson: Aconteceu com alguns animais. Na altura em que foram dados os nomes não perceberam que aquilo de facto não era uma salamandra, era um tritão. Como alguns sapos que são rãs. Os técnicos, os cientistas e os biólogos não mudaram o nome. A rã de focinho pontiagudo na verdade é um sapo. Acho que aconteceu isso com a salamandra de costelas salientes, só perceberam que era um tritão geneticamente muito mais tarde.

Dinis: O nome em latim é Pleurodeles.

 

Esse animais têm uma importância no ecossistema diferente das cobras?

Dinis: As salamandras salientes, devido ao seu tamanho, comem outras pragas. Às vezes até nem são pragas, é só mesmo para equilibrar e outros animais não voltarem.

Nelson: Mas não podemos dizer que é mais ou menos importante Acontece com os anfíbios, em específico com os anfíbios, estão muito mais ameaçados do que os répteis. Talvez 40% ou 45%. E isso não acontece com os répteis. Não é que os répteis sejam mais ou menos importantes que os anfíbios, ou vice-versa, até porque as cobras comem algumas salamandras. São todos da cadeia um dos outros. As salamandras comem moluscos e caracóis. É um ciclo importante. Se tiver uma interrupção nesse ciclo há um desequilíbrio depois do ecossistema.

Dinis: Montes de anfíbios andam a morrer por causa dessas doenças que as pessoas transmitem aos anfíbios através da pele, porque eles respiram pela pele.

 

Dinis começlou a fazer vídeos e a publicá-los nas redes sociais para “para mostrar às pessoas que a natureza não é assim tão má e nojenta”.

Todos os animais são importantes, mas tu gostas mais dos répteis e anfíbios, certo?

Dinis: Se queres que te diga, se há animais a que estou a dar muita atenção hoje em dia, são os peixes. Animais marinhos, vamos dizer assim. Lulas gigantes, tubarões, baleias. Vou a Lisboa daqui a uns dias fazer observação de golfinhos. Vou ver se vejo uma baleia, se a vir vou mergulhar com ela. Ninguém me pode parar.

Nelson: Não vais nada.

Dinis: Vou até de roupa! Pai, é o meu sonho desde pequeno. Todo o ecossistema marinho está muito super ameaçado, mas a maior parte das pessoas não tem essa noção.

 

Por isso achas tão importante passar essa mensagem de proteção da natureza?

Dinis: Há muita gente que pensa que o aquecimento global também não é verdade. Eu tenho tanto respeito por essas pessoas como pelas pessoas que acham que a Terra é plana.

Nelson: Ainda ontem estava a falar com uma pessoa do Oceanário, que me disse que quando se fala de alterações climáticas, se fala muito pouco do oceano. Ao contrário do que se pensava há relativamente pouco tempo, o verdadeiro pulmão é o oceano, não é a floresta.

Dinis: Em relação aos animais em extinção, queria também dizer que gosto muito dos insetos, sempre gostei. Já olhaste bem para o mundo à nossa volta? Sabias que, se os insetos não existissem, as cores não existiam. As cores das flores e das plantas só são assim para os insetos as reconhecerem. Portanto, sem insetos seria tudo a mesma cor. A natureza podia ser toda igual. Sem os insetos o mundo seria um asteroide.

Os insetos são literalmente o começo da cadeia alimentar. Sem insetos não haveria nada. Os mosquitos são polinizadores e muita gente não sabe disso. Sem mosquitos o mundo iria ser muito diferente, para pior.

“Se os insetos não existissem, as cores não existiam. As cores das flores e das plantas só são assim para os insetos as reconhecerem. Portanto, sem insetos seria tudo a mesma cor. A natureza podia ser toda igual. Sem os insetos, o mundo seria um asteroide”. 

Vocês costumam explorar aí mais pelo norte ou também vão descobrir outras zonas do país?

Dinis: Costumamos ir muito para o norte, mas às vezes também para o sul. Há 15 dias estivemos ali na zona do Gerês, em Castro Laboreiro à procura de víboras. E encontrámos.

 

Qual foi o ecossistema mais fascinante, o local da natureza que gostaram mais? 

Nelson: Há uma praia fantástica, a das Avencas, na zona de Cascais.

 

O Nelson também tem formação nesta área? 

Nelson: Não, é só por osmose, tenho estado a aprender com o Dinis. Sou eu que faço um pouco a curadoria do conteúdo dele. Hoje em dia ando a editar muitos vídeos. Às vezes são aqueles vídeos em casa mais formais, que tem havido menos. Temos feito mais vídeos de campo. O Dinis é como uma biblioteca, aprendo muito com ele.

 

Dinis, aqui com o pai numa das suas incursões no terreno em busca de animais, tem o sonho de um dia poder “mergulhar com uma baleia”.

Dinis, sentes muito a necessidade de divulgar e comunicar estes conteúdos? 

Dinis: Sim. Os mosquitos, por exemplo. Há pessoas que não querem saber da natureza e acham que só por ser um bicho deve ser morto.

Nelson: A forma que muitas pessoas têm de lidar com a natureza é matando os animais, alguns até acham que é engraçado matar.

Dinis: Eu faço estes vídeos para mostrar às pessoas que a natureza não é assim tão má e nojenta. Na minha escola, por exemplo, muitas vezes escavo buracos para ver se encontro os bichos que vivem lá em baixo. Sabes o que me dizem? Que eu sou nojento. E eu costumo responder que os nojentinhos são eles, porque a terra é a coisa mais limpa no mundo. O que é realmente nojento é uma garrafa de plástico. Isso sim, devia ser para as pessoas uma coisa nojenta, porque é não natural e faz mal ao mundo.

 

Todos os teus colegas reagem assim ou há colegas que gostam? 

Dinis: Não, tenho já muitos colegas que me ajudam nas explorações.

 

“O que é realmente nojento é uma garrafa de plástico. Isso sim, devia ser para as pessoas uma coisa nojenta, porque é não natural e faz mal ao mundo”.

Qual é a diferença entre a exploração e a expedição?

Dinis: Exploração é o que eu estou a fazer agora. Tenho que sair daqui e procurar um bicho.

Nelson: Se compararmos isto com o futebol, as explorações são os treinos e a expedição é a Champions League. Mais ou menos de 3 em 3 meses fazemos um evento gratuito aberto ao público. Já fizemos um aqui na reserva de Mindelo e também uma outra vez em Lisboa.

 

Diz-me um sítio fora de Portugal que gostasses de visitar.

Dinis: Amazónia, Austrália… e Costa Rica, também. A Amazónia deve ser um dos sítios mais diversos do mundo, com cerca de 5 mil espécies de peixes. O ecossistema lá é super fixe. Na Austrália é mais ou menos o mesmo, em termos de animais.