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Pureza Fleming

Artur Mendes: “Demonstrámos que fazer cultura no interior e de forma sustentável é um exemplo a seguir”

4 Jun 2024 - 09:00
De 17 a 23 de junho, o concelho de Idanha-a-Nova, no distrito de Castelo Branco, volta a ser palco de mais uma edição do festival Being Gathering — o último decorreu em 2017. Sob o tema “Generosity”, o evento combina disciplinas de bem-estar, música, arte e natureza, atraindo curiosos do mundo inteiro que procuram uma experiência holística e a vários níveis enriquecedora. Artur Mendes, co-director do Being Gathering e do Boom Festival, falou com o Green eFact sobre a origem do evento e aquilo que os participantes lá poderão encontrar este ano.

Em que consiste o Being Gathering?

O Being Gathering consiste na fusão entre diversas disciplinas de bem-estar, vários tipos de música e inúmeras formas de expressão artística num cenário em plena natureza. Portanto, é uma fusão de well-being, natureza, artes e música. E o grande tema e foco do Being Gathering é que o público aprofunde o seu conhecimento ou paixão em algumas áreas de bem-estar de uma forma que lhes forneça instrumentos e ferramentas para terem uma vida mais alinhada, mais equilibrada e mais de acordo com aquilo que será o seu propósito, dentro de um conceito de equilíbrio.

 

Quando foi criado e com que objetivo?

O Being Gathering foi criado em 2015 e o objetivo foi fazer um festival que tivesse uma componente espiritual mais focada do que aquilo que é o Boom Festival, uma vez que o Boom tem um conceito artístico, cultural e musical muito próprio e bastante multidisciplinar. Neste caso quisemos fazer um acontecimento mais dedicado a estas temáticas espirituais e promover também um estilo de vida equilibrado, com uma perspetiva mais holística. A componente da celebração está, obviamente, sempre presente, mas o objetivo foi não criar um festival monocultural — ou seja, não ser apenas um festival de yoga ou um festival de ecstatic dance —, mas sim uma fusão de várias disciplinas.

 

O Boom Festival teve, naturalmente, a sua influência no nascimento desta ideia?

A equipa é constituída pelas mesmas pessoas que fazem o Boom Festival, portanto este foi, naturalmente, a influência principal e a grande força motriz de tudo.

Artur Mendes é co-organizador dos festivais Being Gathering e Boom, que nos últimos anos têm sido distinguidos com diversos prémios devido à sua política ambiental e de sustentabilidade.

Quem é o público do evento?

O público do evento é internacional, tal como no Boom, sendo que no Being a população portuguesa é de cerca 30% e no Boom cerca de 15%. São sempre dezenas de nacionalidades, porque nós temos essa capacidade de atração mundial, o que torna estes eventos sempre bastante interessantes. Temos também entre 10% a 20% do público constituído por crianças e teenagers, o que é muito curioso. O Boom já é um festival bastante family-friendly, mas este [o Being] tem uma componente familiar ainda mais forte, a programação termina à meia-noite e há uma série de atividades mais dedicadas às crianças e aos jovens. Com isso conseguimos trazer um público bastante heterogéneo, mas também muitas famílias. É naturalmente um público que tem uma componente de sensibilidade à espiritualidade e à saúde e bem-estar, de uma maneira holística e de uma forma que traduz também a paixão por conhecimentos e tradições ligadas à natureza. Trata-se de um público muito conhecedor daquilo que é o Being Gathering e das temáticas que aqui trabalhamos.

 

No que respeita à programação, que tipo de atividades irá o público encontrar no Being Gathering 2024?

Existem áreas de atividades de grupo, onde existirão facilitadores de yoga, artes marciais, capoeira, etc. Haverá atividades dedicadas ao som, onde vamos desde o ecstatic dance até workshops de dança, mas também espetáculos, sound journeys, muitas áreas de massagens — só nas massagens teremos mais de 100 terapeutas. Teremos atividades terapêuticas no lago, bem como espetáculos e sets de música. E a meditação será também, obviamente, um aspeto muito interessante, bem como tudo o que envolve o breathwork.

“O que fazemos é para a Boomland e fica sempre cá. Consiste em continuar a utilizar materiais naturais e também no tratamento da natureza que é diário, seja na reflorestação, na regeneração de ecossistemas, ou na utilização de materiais mais conscientes”.

E na área da sustentabilidade, quais as ofertas, entre palestras, workshops ou outros eventos?

A sustentabilidade está no núcleo daquilo que acontece na Boomland: a água é tratada e reutilizada; as casas de banho são compostáveis; utilizamos parcialmente energia solar; todos os copos e talheres são biodegradáveis; o festival é 100% vegetariano; fazemos compostagem e também reaproveitamos toda a comida. Não há desperdício alimentar, porque existe uma estratégia de reutilização. Adoptámos toda uma abordagem de upcycling de coisas que são utilizadas no Boom para utilizar aqui no festival [Being Gathering]. Depois, há uma série de workshops e palestras sobre temáticas relacionadas com permacultura e eventos sustentáveis, bem como outras temáticas relacionadas. Há também uma parte dentro daquilo que é uma sustentabilidade mais humana, onde iremos falar sobre saúde mental.

 

Em termos de construção, quer ressaltar algumas medidas sustentáveis que tenham sido implementadas este ano?

Não fizemos medidas específicas para o Being, pois o que fazemos é para a Boomland e fica sempre cá. Consiste em continuar a utilizar materiais naturais e também no tratamento da natureza que é diário, seja na reflorestação, na regeneração de ecossistemas, ou na utilização de materiais mais conscientes. Portanto, não há algo específico para o Being Gathering, nós fazemos para a Boomland e depois todos os eventos acabam por conseguir navegar essa onda. Convido todos os interessados a assistirem aos vídeos que estão nos canais do Boom Festival, que oferecem uma explicação bastante ampla de tudo o que fazemos ao nível de materiais.

 

O Boom Festival tem arrecadado inúmeros prémios internacionais na área da sustentabilidade. Que importância tem esse tipo de reconhecimento?

Um festival ou um evento cultural ganhar prémios na área ambiental é a demonstração que existe um setor de cultura vibrante em Portugal, que consegue estar na vanguarda e na liderança de um segmento tão diferenciador como este dos festivais sustentáveis, do qual o Boom é, de facto, um exemplo a nível mundial, como se comprova pelos muitos prémios recebidos, apesar da indiferença do poder em relação a isso. Convém ainda referir que se tratam de prémios não pagos, atribuídos por júris da indústria que vêm ao festival aferir todos estes aspetos ligados à sustentabilidade. Como tal, é uma credibilização muito grande do festival, que demonstra que fazer cultura no interior, de forma sustentável, é um exemplo a seguir.

É importante notar que este é um projeto totalmente independente e o facto de se realizar no interior, e de ser também acompanhado por um projeto de regeneração ambiental, credibiliza ainda mais não apenas os prémios, mas todo o processo.

O Being Gathering assume-se como um festival “amigo das famílias”, com uma série de atividades exclusivamente dedicadas às crianças e aos jovens.

Como é que está a “terra” de “saúde”? Foi um bom inverno?

O inverno foi ótimo, houve muita água, portanto não temos os problemas de seca que já enfrentámos em anos anteriores. No entanto, há sempre questões a ser tratadas todos os anos, porque estamos a trabalhar com a natureza e nunca contra ela. Isso dá-nos uma responsabilidade extra. O facto de haver muita água significa que o que tem acontecido, ao nível da regeneração, esteja bastante vibrante. É fantástico ver os esforços de regeneração de novas árvores, novos jardins e novas áreas de exploração a funcionarem. E haver uma boa harmonização entre a presença humana e a natureza.

 

Quantas pessoas esperam receber na Boomland já no próximo mês de junho?

Entre duas a cinco mil pessoas, que é a lotação limitada do Being Gathering.

O festival espera receber entre duas a cinco mil pessoas de dezenas de nacionalidades.

O que é que consideraria obrigatório para se ter uma óptima experiência, seja no evento em si, seja para aproveitar ao máximo a natureza que o rodeia?

Obrigatório é as pessoas virem de espírito aberto e com uma perspetiva de se permitirem transformar, de encontrar um caminho para serem uma versão mais positiva e menos impostora para si próprias. Que consigam sentir o lado de luz e o lado de sombra num espaço como este, sem julgamentos. E que, no final, cheguem à conclusão que somos sempre os melhores amigos de nós próprios. Mas ao mesmo tempo percebam o quanto necessitam também do outro ser humano, da pessoa semelhante. Isso é para nós algo muito importante, até porque o tema desta edição é “Generosity”.