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Teresa Lencastre

Porque é que há pessoas que negam as alterações climáticas?

23 Apr 2024 - 09:59
Apesar do amplo consenso científico sobre o aquecimento global e sobre a responsabilidade humana nas alterações climáticas, há ainda quem negue o problema.

Em Portugal, números recentes sugerem que o chamado “negacionismo climático” não é tão premente. Mas noutros países, como nos Estados Unidos da América (EUA), a descrença nas alterações climáticas persiste, apesar do amplo consenso científico sobre esta questão.

A par dos EUA – onde, vale a pena notar, também há mais investigação sobre o assunto –, a Arábia Saudita ou a Indonésia também já foram apontadas no passado como “líderes” mundiais do negacionismo climático. Mas o que está por detrás deste ceticismo?

Donald Trump é considerado por muitos um impulsionador do negacionismo climático. Enquanto presidente dos EUA, retirou o país do Acordo de Paris sobre o clima e chegou a dizer que as alterações climáticas são uma “farsa”.

Muitos estudos têm vindo a dissecar o fenómeno, que consiste na negação, rejeição ou dúvida injustificada em relação ao consenso científico sobre as alterações climáticas. Um deles, assinado por uma investigadora da Universidade de Stanford e uma especialista em Psicologia Social, defende que a necessidade de manter o status quo e a resistência à mudança são causas possíveis.

“As alterações climáticas são altamente ameaçadoras para a estabilidade e a legitimidade do sistema”, dizem Gabrielle Wong-Parodi e Irina Feygina. “Muitas das soluções para o problema têm consequências económicas e exigem mudanças, o que também suscita resistência”, adiantam. “Algumas pessoas respondem a esta ameaça negando a realidade das alterações climáticas, em vez de as aceitarem e de se comprometerem a tomar medidas que possam fazer face às suas terríveis implicações.”

As alterações climáticas tornaram-se uma questão ideológica altamente polarizada nos países industrializados e a negação da existência do aquecimento global passou a fazer parte da identidade política de certos grupos ideológicos.

Por outro lado, defendem, o negacionismo climático é um elemento que contribuiu para a formação da identidade de certos grupos, sobretudo no espetro conservador. “As alterações climáticas tornaram-se uma questão ideológica altamente polarizada nos países industrializados e ricos”, explicam. “Como resultado, as pessoas formam opiniões baseadas não em factos ou informações, mas na necessidade de se filiarem e serem aceites pelos grupos com que se identificam.”

A ideia de que o negacionismo climático é um fator identitário também é explorada num estudo recém-divulgado pela Universidade de Bonn e publicado na Nature Climate Change. Um dos autores, o economista Florian Zimmermann, admite que “a negação da existência do aquecimento global provocado pelos humanos faz parte da identidade política de certos grupos de pessoas”.

Por outras palavras, lê-se num comunicado da Universidade de Bonn, “algumas pessoas podem, em certa medida, definir-se pelo facto de não acreditarem nas alterações climáticas”.

Enfatizar o consenso científico pode ser uma forma de prevenir o discurso negacionista.

Hanno Sauer, especialista em ética e filosofia política, também enquadra o negacionismo climático numa lógica de polarização de opiniões, à semelhança de Wong-Parodi e Feygina. Mas vai mais longe.

No livro “Moral, A Invenção do Bem e do Mal”, o autor considera que a radicalização de alguns ativistas ambientais também agrava o problema, citando alguns “exageros” e “propostas cada vez mais extremas (…) e menos aceitáveis para as massas”.

“O resultado é que temos um grupo de céticos climáticos politicamente influentes e hostis à ciência, bem como um grupo de profetas apocalíticos politicamente influentes e hostis à ciência”, diz o autor.

A radicalização de alguns ativistas ambientais também agrava o problema.

Uma das formas de combater o negacionismo climático, propõe outra análise, é a disseminação de “mensagens preventivas de inoculação”. Trata-se de uma estratégia de comunicação que veicula antecipadamente informações corretas ou esclarecimentos sobre a desinformação que possa eventualmente surgir.

Enfatizar o consenso científico nesse tipo de comunicações, por exemplo, pode ser uma forma de prevenir o discurso negacionista.