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Marina Prieto Afonso

Modos de vida e impactos sobre a saúde e o ambiente: porque escolhemos viver na cidade em vez de viver no campo?

14 Aug 2024 - 09:00
Uma das questões que mais preocupam os demógrafos, os urbanistas, os ecologistas e os agricultores consiste no massivo êxodo das populações rurais para os centros urbanos. Este movimento começou em meados do século XX e não parou de crescer, apesar das evidências de que viver nas cidades expõe as populações a mais ruído, mais poluição e mais stress social. Assim, quais as razões para este fenómeno?

A preferência pela vida urbana é motivada por uma ampla gama de fatores que abrangem aspetos económicos, sociais, culturais e de conveniência. Nas cidades há uma maior diversidade de empregos, em diferentes setores, incluindo tecnologia, finanças, saúde, educação e serviços. Os salários são superiores, quando comparados com as áreas rurais, e existem mais e melhores oportunidades para empreendedores, incluindo acesso a mercados maiores e redes de apoio a jovens empresários.

A educação e a formação superior e ao longo da vida encontram-se nas cidades, que muitas vezes abrigam universidades, faculdades e escolas técnicas de renome, proporcionando acesso a educação variada e de qualidade. Bibliotecas, centros de investigação, museus e outras instalações educativas avançadas encontram-se também nas cidades e mais raramente na província.

A presença de hospitais, clínicas especializadas e profissionais de saúde qualificados, assim como a assistência médica imediata são outros fatores de preferência das cidades enquanto locais de vida. Os centros urbanos geralmente dispõem de transportes públicos e de serviços públicos mais próximos e frequentes, uma maior variedade de opções de entretenimento, como cinemas, teatros, restaurantes, bares, parques e eventos culturais e, em geral, uma conexão com a internet mais rápida e confiável.

A facilidade para fazer amigos e participar de uma vida social mais ativa e cosmopolita, e o acesso a uma ampla gama de lojas, mercados e centros comerciais com disponibilidade de serviços como ginásios, cabeleireiros, e outros, associados a uma maior variedade de opções habitacionais, com proximidade a aeroportos e estações de comboio ou camionetes, tornam a vida nas cidades rica em oportunidades económicas, educacionais e culturais.

O crescimento urbano rápido que se verifica desde meados do século passado apresenta desafios significativos para a sustentabilidade urbana, e também rural.

No entanto, o crescimento urbano rápido que se verifica desde meados do século passado apresenta desafios significativos para a sustentabilidade urbana, e também rural, pois o êxodo para as cidades tem profundos impactos nas áreas rurais.

A saída de trabalhadores jovens e capazes resulta numa força de trabalho envelhecida e menos dinâmica, o que pode levar à redução da produtividade agrícola. Além disso, a diminuição da população ativa afeta o mercado local, reduzindo a procura por bens e serviços e dificultando a manutenção dos negócios regionais.

A saída de jovens em idade produtiva resulta no enfraquecimento das estruturas familiares e comunitárias, e a falta de uma população nova e ativa leva ao abandono das aldeias e à deterioração dos laços sociais, afetando a coesão e a identidade das comunidades rurais.

Além disso, a migração para as cidades pode resultar numa carga desproporcional de cuidados para os membros mais velhos da família que permanecem nas áreas rurais. A ausência de jovens para cuidar dos idosos agrava os problemas de saúde e de bem-estar social, criando nas áreas rurais um conjunto de problemas na assistência aos mais velhos.

A migração de populações rurais tem consequências ambientais como o abandono das terras agrícolas, resultando em mudanças no seu uso que afetam a biodiversidade e os ecossistemas locais.

A migração urbana também pode levar à perda dos conhecimentos agrícolas tradicionais. As técnicas e saberes passados de geração em geração são perdidos quando os jovens deixam o campo, o que pode comprometer a sustentabilidade da agricultura a longo prazo. A migração de populações rurais tem consequências ambientais como o abandono das terras agrícolas, resultando em mudanças no seu uso que afetam a biodiversidade e os ecossistemas locais.

Em alguns casos, o abandono das terras cultivadas pode permitir a regeneração natural, mas noutros, pode levar à degradação do solo, à invasão por espécies não nativas e ao desaparecimento de populações animais, como certas aves, comensais durante séculos dos cultivos humanos.

O aumento das populações urbanas também afeta a sustentabilidade das cidades. Os centros urbanos precisam de grandes quantidades de recursos para sustentar as suas populações, incluindo água, energia e alimentos, e a concentração de pessoas em áreas urbanas pode levar à sobrelotação do espaço, a pressões sobre a infraestrutura elétrica, de saneamento e de acessos, assim como ao aumento da produção de lixos. A gestão sustentável desses recursos e resíduos é crucial para mitigar os impactos ambientais negativos.

As áreas urbanas são ainda grandes fontes de poluição, contribuindo significativamente para as emissões de gases com efeito de estufa. Os usos extensivos de veículos motorizados geram poluentes que afetam a qualidade do ar e contribuem para o aquecimento global e a deterioração da saúde. Além disso, a poluição urbana afeta diretamente os ecossistemas locais.

A contaminação de solos e da água com produtos químicos, metais pesados e resíduos sólidos pode prejudicar plantas e animais. A poluição luminosa e sonora altera o comportamento de diversas espécies, impactando negativamente nos seus ciclos biológicos e nas interações ecológicas A adoção de tecnologias verdes, como as energias renováveis e os transportes públicos eficientes, é essencial para reduzir essas emissões.

Uma equilibrada distribuição das populações humanas pelos espaços rurais e urbanos pode garantir oportunidades económicas, sociais e, em geral, de qualidade de vida, que não se concentram somente nas cidades.

A expansão urbana muitas vezes resulta na conversão de terras agrícolas e áreas naturais em espaços urbanos. Este fenómeno, conhecido como urban sprawl, pode levar à perda de habitats naturais e à fragmentação de ecossistemas.

A proteção e a integração de áreas verdes nas cidades, bem como a promoção do desenvolvimento urbano denso e vertical, são estratégias importantes para preservar a biodiversidade. Ao fragmentar o espaço, a urbanização reduz a disponibilidade de áreas contínuas necessárias para a alimentação, reprodução e migração de espécies animais, o que pode levar à diminuição das suas populações e, em casos extremos, à extinção local.

As cidades são pontos de entrada para espécies invasoras, que podem competir com as espécies nativas por recursos, alterando o equilíbrio dos ecossistemas. Essas espécies invasoras podem ser plantas ornamentais cujas sementes crescem na terra disponível nas cidades, animais de estimação libertados em parques ou jardins, ou pequenos organismos transportados acidentalmente através das atividades de comércio humano.

Em conclusão, podemos dizer que uma equilibrada distribuição das populações humanas pelos espaços rurais e urbanos pode garantir oportunidades económicas, sociais e, em geral, de qualidade de vida, que não se concentram somente nas cidades. Parece essencial promover políticas que incentivem uma distribuição mais equilibrada das populações entre as áreas urbanas e rurais.

Esta distribuição não fomentará apenas um desenvolvimento rural mais sustentável e a preservação dos ecossistemas, mas também melhorará a qualidade de vida de todos, humanos e não humanos, tanto no campo como na cidade. Garantir que as populações tenham acesso a oportunidades económicas, serviços sociais de qualidade e a um ambiente saudável em ambas as áreas é a chave para um futuro sustentável para todos.