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Diogo Augusto

Portugal é o país da UE onde mais pessoas não conseguem aquecer a casa?

3 Nov 2024 - 10:00
A questão do (não) aquecimento das casas é recorrente a cada inverno em Portugal, o que só por si atesta a pobreza energética do país, também comprovada pelos números do Eurostat, apesar da situação ter melhorado bastante na última década.
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De acordo com dados do Eurostat, 20,8% das pessoas em Portugal não consegue aquecer a sua casa apropriadamente. É a maior percentagem da União Europeia, num primeiro lugar partilhado com a Espanha e bem longe dos 2,1% de Luxemburgo.

Em 2007, Portugal apresentava o dobro dos valores, com 41,9% da população incapaz de aquecer a casa. Desde aí, com a exceção de um período de estagnação entre 2009 e 2014 a percentagem tem vindo a descer.

No entanto, desde 2022, tem-se verificado uma nova subida que coincidiu com a invasão russa da Ucrânia e a subida vertiginosa dos preços da energia.

De acordo dom o Eurostat, 20,8% da população portuguesa não consegue aquecer a casa de forma apropriada, uma melhoria em comparação com o ano de 2007, quando este valor era sensivelmente o dobro, mas ainda assim insuficiente para retirar o país da cauda da Europa neste tópico concreto. (foto: Freepik)

Marta Oliveira Panão, professora do Departamento de Engenharia Geográfica, Geofísica e Energia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa disse ao Green Efact que “a localização geográfica é um fator importante a ter em conta”, uma vez que, as necessidades energéticas dos países nórdicos, mais frios, serão necessariamente diferentes das dos países do Sul como Portugal.

Se 23% do consumo energético dos portugueses se deve ao aquecimento ambiente, “81% desse valor trata-se de biomassa (principalmente lenha, mas também pellets),” diz a docente, “nem sempre utilizada em equipamentos de elevada eficiência, pelo que a utilização de recursos energéticos para aquecimento é, em Portugal, muito inferior aos restantes países.”

A ADENE, Agência para a Energia, sublinha que, na verdade, o consumo de energia em Portugal tem aumentado, sem que isso corresponda necessariamente a um aumento do conforto dentro das casas.

“Um parque habitacional envelhecido e com deficiências em termos de isolamento térmico e sistemas de aquecimento tem, obrigatoriamente, consequências negativas no bem-estar e na saúde dos cidadãos,” afirma a agência “além de implicar custos energéticos mais elevados”. Assim, “a qualidade do parque habitacional é um fator determinante para a capacidade dos portugueses em aquecerem as suas casas de forma eficiente e económica.”

“Um parque habitacional envelhecido e com deficiências em termos de isolamento térmico e sistemas de aquecimento tem, obrigatoriamente, consequências negativas no bem-estar e na saúde dos cidadãos,” afirma a Agência para a Energia.

Assim e ainda que, segundo outra série estatística do Eurostat, só Malta consuma menos energia per capita do que Portugal, há, no nosso país, um problema de eficiência. Marta Panão alerta para o facto de, apesar da implementação de diretivas europeias que pretendem aumentar a eficiência energética das famílias – como “a etiquetagem energética de equipamentos, a eliminação gradual da comercialização de lâmpadas incandescentes ou a regulação da potência de stand-by” –, isto não se tem traduzido numa diminuição dos consumos em Portugal.

Tal acontece porque à medida que os equipamentos se vão tornando mais eficientes, as famílias também vão consumindo mais equipamentos igualmente mais potentes que os anteriores.

É nesse sentido e tendo em conta que os ganhos de eficiência são frequentemente anulados pelo aumento do consumo, que Marta Panão faz uma distinção entre o princípio da eficiência e o princípio da suficiência.

“Existe ainda um caminho a percorrer para que as políticas energéticas estejam alinhadas com os princípios da suficiência energética. Se o princípio da eficiência se baseia na racionalidade económica de um planeta sem limites, o princípio da suficiência baseia-se na racionalidade ecológica que considera os limites do planeta”, explica a docente.

Também segundo o Eurostat, só Malta consome menos energia per capita do que Portugal, o que significa que existe, no nosso país, um problema de eficiência.

Paradoxalmente, para Marta Panão, uma das explicações para os reduzidos gastos no aquecimento pode estar na “fraca qualidade das habitações”, pois não é suficiente ter o ar aquecido para sentir conforto térmico. “É necessário que as superfícies à nossa volta também estejam aquecidas e isso é muito difícil em habitações sem isolamento térmico”. Ou seja, “o desconforto persistente, mesmo quando tentamos aquecer os espaços, alimenta a perceção que  o gasto de energia simplesmente não compensa.”

A isto somam-se ainda outros fatores, como a disponibilidade financeira para fazer este tipo de investimento, a necessidade de acordo de condóminos em edifícios multifamiliares ou a dificuldade em antever um retorno financeiro.

Razões suficientes para a ADENE considerar que “existe ainda bastante trabalho a desenvolver, pois é necessário apoiar a reabilitação tendo em vista o desempenho energético e atividades a desenvolver ao nível da formação e promoção da literacia energética.”