O número de animais de companhia por agregado familiar deu um salto desde a pandemia, quando muitos viram num amigo de quatro patas uma solução para a solidão do confinamento. Em Portugal, só em 2020, a adopção de cães subiu em 15% e a de gatos em 78%, segundo dados do Sistema de Informação de Animais de Companhia (SIAC). O efeito foi global, com mais de 2 milhões de pessoas no Reino Unido a adoptarem um animal durante os confinamentos. E segundo o mesmo estudo da organização Health for Animals, na Austrália cerca de um milhão de animais foram obtidos no auge da pandemia. Já no Brasil o número de “pets” por lar aumentou cerca de 30% no mesmo período.
Mas entre sacos para apanhar cocós, areias para os gatos e as toneladas de ração que todos requerem, qual é de facto a pegada carbónica dos nossos amigos de quatro patas?
Segundo dados recolhidos pelo investigador inglês Mike Berners-Lee para o livro ‘How Bad Are Bananas?’ (Quão Más São as Bananas?), um cão de porte médio é responsável pela emissão de 770kg de CO2 por ano. Um gato à volta de 310kg de CO2. Até o aparentemente inofensivo peixinho-dourado pode resultar numa “patada carbónica” de 25kg de CO2 anuais.
Um cão de porte médio é responsável pela emissão de 770kg de CO2 por ano.
Alimentação
O mais fiel amigo do homem tornou-se (involuntariamente) um dos nossos maiores aliados no processo de desflorestação. Isto porque a sua alimentação é composta primordialmente por carne de produção industrial. Um estudo liderado pelo geógrafo Gregory Okin e publicado na revista Plos One revelou que “o consumo de produtos de origem animal por cães e gatos é responsável pela libertação de até 64 milhões de toneladas de metano e óxido nitroso equivalentes a CO2”.
Nos Estados Unidos, cães e gatos são responsáveis por um quarto do consumo total de calorias derivadas da carne. Que é o mesmo que dizer que 25% do uso – e abuso – do solo, água, combustíveis fósseis, pesticidas e fertilizantes associados à produção de carne, são da responsabilidade dos nossos amiguinhos felpudos.
Segundo o estudo de Okin, um país populado somente por cães e gatos domésticos ficaria em quinto lugar no consumo mundial de carne, sendo ultrapassado somente pelo Brasil, a Rússia, a China e os Estados Unidos.
As embalagens das rações, bem como dos biscoitos e de outros miminhos, são também uma fonte de poluentes. Segundo a organização norte-americana Pet Sustainability Coalition, 99% dos recipientes e invólucros de alimentação animal acabam em lixeiras em vez de serem reciclados.
Dejetos
Não é aconselhável deixar os presentes do Bobi por apanhar (só em Lisboa a multa pode ir até aos €1140!), mas os dejetos animais e a sua recolha são outra grande preocupação ambiental. E não são só as 0,76-1,23 milhões de toneladas de sacos de plástico necessários mundialmente para recolher cocós que são prejudiciais.
Ao contrário do que se possa pensar, as fezes de animais de estimação não são bons fertilizantes. A Agência de Proteção Ambiental britânica já classifica o cocó de cão como um poluente, estando na mesma categoria que inseticidas e derrames de óleo. Isto porque o alto teor de proteína na alimentação animal resulta em fezes muito ricas em nutrientes como o nitrogénio e o fósforo – ótimos ingredientes para o crescimento de ervas daninhas, mas nocivos para a biodiversidade e para ecossistemas equilibrados.
Os dejetos dos gatos domésticos podem também ser prejudiciais, tanto como resultantes de uma alimentação excessivamente proteica, como pela forma como são recolhidos. A maior parte da “areia” para gatos é na verdade feita de argila, provinda de mineração intensiva. A areia de sílica é menos poluente, mas, tal como a de argila, não é biodegradável.
Acessórios
Sejam eles cães, gatos, periquitos ou hamsters, os nossos animais de estimação precisam de uma parafernália de acessórios para conviverem num ambiente doméstico.
A grande maioria das coleiras, gaiolas, caminhas, brinquedos e utensílios de alimentação animal são feitos de plástico não reciclado e não reciclável.
Como ser um dono responsável
É altamente improvável que cães, gatos e demais patudos deixem de ser os nossos queridos animais de estimação num futuro próximo. Por isso, é importante tomar consciência do efeito que os ter tem no planeta e tentar minorar o seu impacto.
Hoje já há no mercado alternativas mais amigas do ambiente para todos os problemas delineados neste artigo. Desde rações que conseguem reduzir a sua pegada carbónica utilizando menos e melhor carne, e embalagens recicláveis; a sacos para cocós e areias para gatos totalmente biodegradáveis. Também já é possível comprar acessórios feitos de materiais naturais, reciclados e recicláveis.
Há também muita coisa que pode ser reaproveitada lá de casa. Os animais podem comer algum do nosso “desperdício” alimentar, como as cascas de algumas frutas e legumes, desde que não seja nocivo para a sua saúde. Os brinquedos, podemos ser nós mesmos a fazer, reutilizando roupas e trapos, ou caixas de cartão. E graças à internet já há vários sítios onde comprar em segunda mão quase tudo o que de resto é preciso para os nossos animais de companhia.
Por último há que relembrar aqueles à procura de um novo amigo, mas preocupados com o seu impacto ambiental, que a adopção é sempre preferível à compra. Isto porque a adopção desincentiva a indústria de “criação”, reduzindo assim a pegada de CO2 dos nossos animais de estimação.