Da horta vertical, nasce um empenho no impacto social e na sustentabilidade, que visa não só combater a pobreza e a desigualdade das populações urbanas, mas também promover a literacia alimentar, capacitar as comunidades, incluindo as reclusas, para facilitar a sua reinserção social e garantir o direito a uma alimentação condigna.
A horticultura é tanto ferramenta-chave como fio condutor. O primeiro projeto comunitário que a Upfarming ergueu, depois de ter ganho o apoio do programa Bip/Zip, foi uma estufa em Alvalade, cujo objetivo se centrou na inclusão social da população de dois bairros dessa freguesia – o bairro das Murtas e o bairro Pote d’Água –, numa perspetiva de soberania alimentar.
Aqui, a empresa propôs-se trabalhar junto da população feminina e da população idosa, através da dinamização de eventos comunitários no setor da arte e da cultura. Mas a sua ação estende-se à restante comunidade de Alvalade, na medida em que pensa a construção de laços de comunidade e o desenvolvimento de competências interpessoais e técnicas que podem ser partilhadas e nutridas sem tempo limite nem metas financeiras.
De dois bairros passou para uma escola pública, na mesma freguesia, onde implementou um anel florestal, uma horta horizontal e outra vertical, com 30 torres aeropónicas (cuja produção não precisa de terra e as espécies são alimentadas por uma solução de água e nutrientes naturais) e uma estação de compostagem. Contam-se cerca de 130 ninhos agro-florestais, 300 árvores e 500 plantas comestíveis.
Para a ONG Upfarming, a horticultura é tanto ferramenta-chave como fio condutor para a inclusão social.
Como? Espaço, trabalho em rede e uma equipa recetiva parecem ser os ingredientes essenciais, pelo menos para esta receita-piloto. “É uma escola que tem algum espaço e tem uma equipa recetiva, o que é importante quando os recursos são escassos. Mais uma vez em rede”, afirma Margarida, garantindo que “sem um trabalho em rede não seria possível chegar aos beneficiários dos vários projetos” desenvolvidos pela Upfarming.
Os sítios de intervenção não são escolhidos ao acaso, mas a recetividade e o apoio dos vários parceiros, sejam eles institucionais ou da sociedade civil, para a implementação das ideias da Upfarming são de importância acrescida, porque só assim se cresce “organicamente”, explica a empresária. Neste caso, foi considerada a disparidade social identificada nesta área.
E da escola pública se passou para o Estabelecimento Prisional de Torres Novas, para conduzir o terceiro projeto-piloto, “Horticultura Vertical, Solidariedade Horizontal”, financiado pelo prémio BPI Fundação “la Caixa” Solidário 2022, com vista à inclusão social de 42 pessoas reclusas através da produção hortícola.
“Este é um estabelecimento de saída, em que os reclusos fazem ali a transição final”, no qual passam “normalmente os dois anos finais da sua pena e já estão em regime aberto ao exterior, numa fase de reinserção”, explica Margarida Villas-Boas.
Esta condição justifica o facto de a maneira como o projeto foi implementado “não se poder replicar noutros contextos prisionais”, tendo ele de se adequar às especificidades dos lugares e das pessoas que visa.
Margarida Villas-Boas salienta que “sem um trabalho em rede não seria possível chegar aos beneficiários dos vários projetos” desenvolvidos pela Upfarming.
A intervenção no Estabelecimento Prisional de Torres Novas, com a construção de 40 torres agrícolas, não surge particularmente como resposta a necessidades ou a interesses pessoais das pessoas visadas (como, por exemplo, o gosto pela prática da horticultura ou a identificação de práticas alimentares menos boas em contexto prisional), mas Margarida Villas-Boas deixa claro que a atenção está voltada para a inclusão social de comunidades vulneráveis e para a sua capacitação, através de uma “ferramenta terapêutica e de reabilitação pessoal”.
Neste caso particular, as 42 pessoas visadas ficaram certificadas como operadores agrícolas, numa tentativa de aumentar as condições de empregabilidade no futuro.
Quis-se ainda, por outro lado, revolucionar a cozinha do estabelecimento prisional, melhorando a dieta da população reclusa.
“A partir do momento em que as cozinheiras do recinto prisional podem deslocar-se à horta e colher verduras para fazer uma sopa fresca ou para fazer uma salada, imediatamente a refeição torna-se mais rica e apetitosa, com uma apresentação completamente diferente”, exemplifica.
As verduras que os reclusos produziram na horta foram suficientes tanto para seu proveito próprio como para apoiar 175 famílias carenciadas.
As verduras que os reclusos produziram na horta foram suficientes tanto para seu proveito próprio como para apoiar 175 famílias carenciadas, identificadas pelo Centro de Reabilitação e Integração Torrejano (CRIT) e pela Cruz Vermelha de Torres Novas, através da distribuição de cabazes solidários.
Ainda que não haja fórmula para replicar o projeto em qualquer um dos contextos, as candidaturas apontam para mais duas intervenções vindouras no contexto prisional: um com a mais população jovem, outro com a população feminina.