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Teresa Lencastre

Pedalar sem Idade: combater a solidão com uma pegada reduzida

4 Sep 2024 - 09:00
Combater a solidão de quem tem pouca mobilidade é um dos grandes objetivos do Pedalar sem Idade. O movimento é composto por uma rede de voluntários, que passeiam de bicicleta com seniores ou pessoas com deficiência, devolvendo-lhes a possibilidade de serem ativos e de saírem de casa. O projeto também tem preocupações ambientais, destacando-se a pegada carbónica reduzida.

“Não se esqueçam de mim!”, diz repetidamente Rosalina Matamá, ao despedir-se, no final do passeio, no Jardim da Arca de Água, no Porto. É a primeira vez que anda numa bicicleta do Pedalar sem Idade, desde que se mudou de Lousada para um lar portuense “por necessidade”, há um ano.

“Estou sempre lá dentro”, lamenta. “Às vezes vou ao supermercado, além disso não saio. Hoje é que foi um dia espetacular, o número um desde que estou aqui”, conta. “Vou estar sempre a pedir para vir, elas não me vão aturar! Uma vez que estou aqui, posso conhecer o Porto.”

A experiência de Rosalina resume o propósito do Pedalar Sem Idade: combater o medo do esquecimento, presente nas suas palavras. O movimento, que nasceu na Dinamarca em 2012 e chegou a Portugal em 2018, é constituído por uma rede de voluntários, que passeia pelas cidades com seniores, mas não só. Outros grupos com mobilidade reduzida, nomeadamente pessoas com deficiência, também são beneficiários deste programa gratuito.

As viagens têm a duração de uma hora e são feitas a bordo de bicicletas elétricas adaptadas. Também conhecido por ‘trishaw’ ou ‘ventoleta’, este meio de transporte é conduzido por “pilotos voluntários”, tem três rodas, um sofá confortável que leva até duas pessoas e uma capota e cobertor para os dias mais frios. O formato do veículo possibilita outro aspeto central no projeto: a troca de experiências e de histórias.

Rosalina Matamá e João Freitas, dois beneficiários do Pedalar Sem Idade. Antigo taxista, João brinca e diz que agora tem um “táxi especial”. Questionado sobre o que mais gosta no projeto, João destaca “a convivência na rua”.

Sílvia Freitas, responsável pela chegada do movimento a Portugal e diretora do projeto na Área Metropolitana do Porto, explica que “promover a inclusão na comunidade e combater o isolamento social” são dos principais objetivos do Pedalar Sem Idade. Além disso, o projeto “torna a cidade mais ciclável”, trazendo “um ganho muito grande de conciliação entre automobilistas e ciclistas”.

“É muito engraçado. Às vezes, os [automobilistas] vão a pressionar-nos, vão a buzinar, mas depois veem quem nós levamos e pedem desculpa”, conta. “As pessoas cada vez nos conhecem mais, e quando nos veem ao longe já estão a parar para nós passarmos, é fantástico.”

O Green eFact acompanhou um passeio na zona da Arca de Água, no Porto. A cidade conta com 50 voluntários, que pedalam duas horas por semana, beneficiando 200 pessoas por mês. 70% são seniores e os demais 30% são pessoas com deficiência.

Em Portugal, o movimento foi inaugurado no Porto, pelas mãos de Sílvia Freitas e um grupo de amigos com quem já tinha um clube de rotários. Hoje, está presente em várias cidades do país, com uma gestão descentralizada, mas sob a mesma bandeira.

Além do Porto, há dezenas de voluntários a pedalar em Lisboa, Sintra, Cascais, Almada, Castro Verde, Vila Franca de Xira, Castelo Branco e Guimarães. O movimento continua a expandir-se, tendo chegado a Matosinhos em maio e a Espinho e Coimbra em julho.

“O projeto foi crescendo e neste momento está em mais de 50 países, com 33 mil pilotos voluntários por todo o mundo. Há um encontro anual, em Copenhaga, que este ano aconteceu há uns meses, onde todos os pilotos se juntam”, conta Sílvia Freitas.

Sílvia Freitas (em pé, à esquerda), foi a responsável por trazer o projeto Pedalar sem Idade para o Porto. A seu lado está a voluntária Marlene Martins, que já gostava de andar de bicicleta, mas foi motivada para se juntar ao projeto ao ter conhecimento da situação de uma vizinha mais velha, que só saía de casa para ir ao hospital.

Por promover a mobilidade através de bicicletas elétricas, o projeto também tem um cunho ambiental, adianta a responsável pelo projeto no Porto. “Nós medimos a nossa pegada carbónica e é muitíssimo inferior à de um carro, mais de 10 vezes”, revela.

“No ano passado, ganhámos o programa EDP Energia Solidária que nos permitiu carregar algumas das nossas baterias com recurso a energia solar. É quase neutra a nossa pegada.”

Por outro lado, conta Sílvia Freitas, os próprios passageiros mais velhos também promovem comportamentos mais conscientes. “É curioso, temos aprendido muito com os idosos”, descreve.

“Eles poupam muita água, são pessoas que trazem sempre sacos de plástico nas carteiras. Passaram por muitas dificuldades e, apesar de tudo, essas dificuldades educaram-nos. Não concebem o desperdício e têm grandes preocupações ambientais com a sazonalidade dos alimentos, por exemplo. Sabem quando é para comprar tomate ou laranja”, revela.

As viagens têm a duração de uma hora e são feitas a bordo de bicicletas elétricas adaptadas, também conhecidas como ‘trishaw’ ou ‘ventoleta’.

Geralmente, os beneficiários do programa são sinalizados por instituições ligadas à terceira idade ou a pessoas com deficiência, explica Sílvia Freitas. Apesar disso, o Pedalar Sem Idade também está disponível para particulares, que chegam por intermédio de assistentes sociais ou por contacto direto.

Na Área Metropolitana do Porto, os interessados podem marcar um passeio no site Pedalar Sem Idade Porto, ou através do número de telefone +351 934 336 764. Para outras cidades, o site Pedalar Sem Idade Portugal também oferece essa opção de agendamento online ou pelos telefones +351 936 733 797 ou +351 210 999 600.

Interessados em tornar-se pilotos voluntários podem candidatar-se pelas mesmas vias. Para começarem a pedalar devem antes fazer uma breve formação disponibilizada pelo projeto.