O turismo é um dos setores económicos mais dinâmicos do mundo. Responsável por 10% do Produto Interno Bruto (PIB) global, a indústria das viagens e do turismo emprega perto de 350 milhões de pessoas e cria um em cada cinco novos postos de trabalho em todo o mundo. De acordo com o World Travel & Tourism Council, 2024 foi um ano de recordes para o setor e as previsões apontam para um crescimento contínuo ao longo da próxima década.
A pujança económica do turismo é acompanhada por impactos ambientais. No mês passado, um estudo publicado na revista Nature Communications concluiu que as emissões globais associadas ao setor têm crescido duas vezes mais depressa do que a economia global. Descrita como “a análise mais rigorosa e exaustiva já realizada sobre as emissões do turismo”, a investigação revela que, entre 2009 e 2019, as emissões do setor cresceram 40%.
Os autores do estudo indicam que o turismo é responsável por 8,8% das emissões globais. A pegada de carbono, em rápida expansão, provém sobretudo da aviação (21%), da utilização de veículos a gasolina e gasóleo (17%) e de serviços públicos essenciais, como o fornecimento de eletricidade (16%). Além disso, os Estados Unidos, a China e a Índia destacam-se como os principais poluidores do setor, representando 60% das suas emissões globais.

A indústria das viagens e do turismo é responsável por 10% do Produto Interno Bruto (PIB) global, emprega perto de 350 milhões de pessoas e cria um em cada cinco novos postos de trabalho em todo o mundo, mas também é responsável por 8,8% das emissões globais.
É neste contexto que o turismo sustentável ganha importância. De acordo com a Organização Mundial do Turismo das Nações Unidas (OMT/UNWTO), trata-se de uma abordagem que equilibra os impactos económicos, sociais e ambientais do setor. O objetivo é garantir benefícios duradouros para visitantes, comunidades anfitriãs e o ambiente, promovendo também a conservação do património natural e cultural.
“Eu uso sempre a definição clássica: o turismo sustentável promove um impacto positivo nas três dimensões da sustentabilidade – económica, social e ambiental”, reforça Manuel Gil Ferreira, um português atualmente envolvido em dezenas de projetos de turismo sustentável em todo o mundo.
Sublinha que o “viajante comum” tende a focar-se no transporte quando avalia a sustentabilidade do turismo, olhando para “as diferenças entre emissões de CO2 entre uma viagem de avião e uma de comboio”. Contudo, considera que o turismo sustentável “é muito mais que isso”, descrevendo-o como “uma metodologia que reflete uma preocupação com o impacto, independentemente da área de atividade económica” dentro do setor.
Manuel Gil Ferreira é gestor de projetos da Tui Care Foundation, uma “fundação de caridade” criada pela gigante alemã TUI, mas que opera de forma independente, procurando promover o impacto positivo do turismo em destinos de férias. Apesar de também ter projetos próprios, a fundação está amplamente vocacionada para o apoio financeiro a projetos já existentes, implementados pelos seus parceiros locais. Com uma forte aposta na sustentabilidade, os projetos tocam temas como a educação, a proteção ambiental, a economia circular, a cultura e o empreendedorismo.

Manuel Gil Ferreira, gestor de parcerias da TUI Care Foundation, e Clara Augusta, líder de uma comunidade de artesãs peruana apoiada por esta fundação.
“Qualquer ator na indústria do turismo sabe que há um desejo crescente das pessoas de gastar o seu dinheiro em experiências autênticas que tragam algo de positivo para os destinos”, justifica. Além disso, até as “ONGs tradicionais”, parceiras da fundação, reconhecem o potencial do turismo sustentável: “Há uma enorme oportunidade, não só financeira, mas também de impacto socioambiental, se, por exemplo, criarem experiências através das quais podem informar os turistas.”
Este crescente interesse reflete-se de igual forma no aumento dos projetos financiados pela fundação. Atualmente, são quase 100 em mais de 30 países, salienta Manuel. “Há um mês eram 80 projetos, e há três meses estávamos a atingir os 60. Há uma forte procura neste momento por projetos deste género, e nós estamos, evidentemente, a crescer.”
No portfólio da fundação incluem-se projetos de reflorestação e conservação ambiental, de gestão de resíduos, de educação de jovens ou de valorização do património cultural, entre outros. No Perú, por exemplo, procura capacitar tecedeiras da montanha de Patacancha, região bastante isolada, e integrá-las no mercado do turismo. Em Cabo Verde, promove a hidroponia para aumentar a produção de alimentos frescos, enquanto em Zanzibar apoia um projeto que transforma resíduos em produtos de qualidade.

Alguns dos projetos apoiados envolvem os turistas, como um, em Bali, que permite participar no restauro de corais.
Noutros países, a fundação tem em curso um programa que protege tartarugas ameaçadas, especialmente em praias de nidificação. “Criámos um sistema de certificação para os hotéis para ajudá-los a transitar para práticas do dia-a-dia operacional que não interfiram com as vidas das tartarugas marinhas”, explica Manuel.
Muitos projetos envolvem os turistas, com visitas guiadas e experiências práticas, como plantar árvores na Gran Canaria, visitar as hortas hidropónicas em Cabo Verde, ou restaurar corais em Bali. “Há mesmo muitas organizações impressionantes e inspiradoras que conseguem operacionalizar estes conceitos”, descreve o gestor de projetos.
Portugal também integra a lista de beneficiários. Um dos projetos resulta da parceria com organização de conservação do ambiente Terra Sintrópica. Sediado em Mértola, o TUI Field to Fork Portugal procura transformar a cadeia alimentar do Baixo Alentejo com práticas de agricultura regenerativa, formando agricultores e equipas de cozinha de hotéis para adotarem métodos sustentáveis e utilizarem produtos locais.
Já o TUI Futureshapers Portugal, em parceria com a IRIS – Incubadora Regional de Inovação Social, apoia empreendedores a desenvolver ideias em turismo sustentável, com mentorias, workshops e prémios para os projetos de maior impacto. A iniciativa, que já vai na sua segunda edição, está prestes a abrir candidaturas.
“Na primeira edição, tivemos o prazer de apoiar projetos extremamente interessantes, como o Pedalar sem Idade, uma organização que oferece passeios de riquexó no Porto, com foco na acessibilidade para pessoas idosas”, descreve Manuel.

Um dos projetos apoiados em Portugal pela Tui Care Foundation foi o Pedalar sem Idade, uma organização que oferece passeios de riquexó no Porto, com foco na acessibilidade para pessoas idosas.
Embora o interesse pelo turismo sustentável esteja a crescer, considerar a sua substituição pelo turismo convencional pode ser, por enquanto, precipitado, admite o português. O preço continua a ser a prioridade, especialmente em Portugal, onde a “relação entre os salários e o custo de vida” é “bastante fraca”.
“Neste momento, não posso mentir: quem não começa por pesquisar voos em ‘metasearchers’ como o Skyscanner ou o Kayak e organizá-los por preço? O mesmo aplica-se ao alojamento, transfers e excursões”, refere.
Ainda assim, mostra-se otimista: “Está, felizmente, a mudar. Existem imensas tendências no turismo que apontam para isso: a busca por mais experiências autênticas, o ‘slow travel’, os ‘homestays’ com comunidades locais. Acho que, enquanto clientes, os nossos gostos estão a mudar, assim como a nossa educação ao nível da sustentabilidade.”
Manuel considera que a indústria responde diretamente às tendências e prioridades dos viajantes, pelo que a mudança depende também dos consumidores. “Quanto mais nós, enquanto viajantes, dermos prioridade ao impacto que as nossas férias podem ter, mais os grandes atores do setor vão responder com soluções inovadoras.”