Mais de 92 itens de detritos marinhos foram recolhidos nas praias e no fundo do mar da Madeira entre 2014 e 2021, revelando-se sob três categorias: detritos flutuantes na superfície da água, no fundo do mar e depositados nas praias.
Os cientistas do MARE-Madeira e ARDITI identificaram 108 espécies incrustantes pertencentes a 11 filos (código utilizado na classificação científica de seres vivos), dos quais 13% eram não-indígenas e que podem ameaçar a biodiversidade local.
Estes resultados destacam a necessidade urgente de medidas para mitigar o impacto ambiental desses materiais invasores que chegam ao arquipélago da Madeira.

Os cientistas do MARE-Madeira e ARDITI identificaram 108 espécies incrustantes, das quais 13% eram não-indígenas. (foto: Patrício Ramalhosa)
As principais descobertas mostraram que o fundo do mar apresentou a maior proporção de espécies não-indígenas (9,6%), seguido pelas praias (4,4%) e pelos depósitos flutuantes (3,9%), sendo que estes atuam como substratos e vetores de dispersão de espécies não-indígenas nas águas da Madeira.
A distribuição dos organismos incrustantes nos diferentes tipos de detritos marinhos revelaram uma predominância de espécies neustónicas, como crustáceos e caranguejos, nos detritos flutuantes.
No fundo do mar os detritos marinhos apresentam maior diversidade, com predominância de briozoários (invertebrados diversos), macroalgas e anelídeos (vermes segmentados ou anelares).
Já nos detritos marinhos depositados nas praias foi detetada uma mistura de espécies neustônicas (organismos que vivem à superfície da água) e bentónicas (organismos que vivem associados ao fundo do mar).

O fundo do mar apresentou a maior proporção de espécies não-indígenas (9,6%), seguido pelas praias (4,4%) e pelos depósitos flutuantes (3,9%). (foto: Patrício Ramalhosa)
Três abordagens foram utilizadas para determinar a origem destes detritos marinhos:
– Marcas de Identificação: 12 itens tinham marcas rastreáveis, identificando sua origem em países como Canadá, Japão, EUA, Portugal, Espanha e França.
– Assinatura Biológica: As espécies não-indígenas encontradas eram nativas principalmente do Mediterrâneo, das Caraíbas e do Atlântico Sul.
– Modelagem Oceanográfica: Simulações de partículas indicaram que a maioria dos detritos marinhos chega à Madeira a partir da costa leste da América do Norte (95,2%), das Caraíbas (44,3%) e do Atlântico Sul.

Os investigadores também destacaram que, além de ser um recetor de detritos marinhos, a Madeira também atua como um exportador de detritos marinhos para outras áreas da Macaronésia. (foto: Soledad Álvarez)
É através das correntes oceânicas do Giro Subtropical do Atlântico Norte que estes detritos são transportados de regiões distantes como as Caraíbas, a costa leste do EUA e também a Península Ibérica num intervalo de 2 a 3 anos.
“A presença desses materiais permite que organismos marinhos, incluindo espécies não-indígenas, colonizem novos territórios, promovendo potenciais impactos ecológicos e econômicos.”, salienta Patrício Ramalhosa, um dos investigadores do MARE-Madeira.
Os investigadores também destacaram que, além de ser um recetor de detritos marinhos, a Madeira também atua como um exportador de detritos marinhos para outras áreas da Macaronésia, como os Açores, Canárias e Cabo Verde. Isso pode facilitar a propagação de espécies invasoras entre arquipélagos, afetando ecossistemas marinhos sensíveis.

Entre as espécies não-indígenas detetadas está o bivalve Isognomon bicolor, registado pela primeira vez na Madeira. (foto: Patrício Ramalhosa)
Entre as espécies não-indígenas detetadas está o bivalve Isognomon bicolor, registado pela primeira vez na Madeira, e a ascídia Botrylloides niger.
O estudo também identificou organismos comuns em detritos flutuantes, como o crustáceo Lepas anatifera e o caranguejo Planes minutus, além de uma variedade de briozoários, macroalgas e anelídeos incrustados nos detritos marinhos que chegam à Madeira.
Frente a este cenário preocupante, os investigadores defendem a implementação de estratégias de monitorização e gestão de detritos marinhos no arquipélago da Madeira, incluindo a sensibilização da comunidade, o reforço da legislação e o envolvimento de stakeholders marítimos na recolha e análise destes detritos.
“Este estudo sublinha a importância de uma abordagem integrada para o combate à poluição marinha e à propagação de espécies invasoras. A Madeira precisa de um plano estratégico eficaz para reduzir o impacto dos detritos marinhos nos seus ecossistemas”, afirma Patrício Ramalhosa, acrescentando que o estudo serve também de modelo para outras regiões insulares.