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Isabel Lindim

Chegou a era da energia solar?

25 Sep 2023 - 05:19
Em Portugal, as centrais de painéis fotovoltaicos estão em grande expansão. Somos um país pequeno, mas estamos prestes a receber o maior parque solar da Europa. Com que ritmo está a ocorrer esta mudança tão drástica na paisagem? E com que impacto?

Todos os anos os dados sobre obtenção de energia através de painéis fotovoltaicos mostram um aumento. Em Julho 2023, a REN (Rede Energéticas Nacionais) registou um abastecimento de 10% da electricidade do país através da energia solar em Portugal. Nos últimos quatro anos, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) já emitiu pareceres favoráveis que permitem triplicar a capacidade fotovoltaica atual.

São boas notícias, tendo em conta que o sector energético é responsável por mais de dois terços das emissões de gases com efeito de estufa, mas a dimensão dos projectos está a levantar dúvidas. A avaliação de impacto ambiental está a ser feita caso a caso pela APA, mas ainda é incerto como vamos viver com a grande aposta na energia solar. Trata-se, sobretudo, de uma questão de escala.

Segundo dados da Direcção Geral de Energia e Geologia, a produção de energia de origem fotovoltaica aumentou substancialmente em 2022 e 2023. Nos primeiros seis meses do corrente ano, perfez um total de 4 483 GWh, ainda longe dos 12 377 GWh da hidráulica e 13 351 GWh da eólica (76% da produção de eletricidade de origem renovável foi obtida através das tecnologias eólica e hídrica, segundo a Direção-Geral de Energia e Geologia), mas em grande avanço relativamente a anos anteriores.

Em Julho 2023, a REN (Rede Energéticas Nacionais) registou um abastecimento de 10% da electricidade do país através da energia solar em Portugal

Esta rápida expansão, através de investimentos privados, traz alguma contestação por parte de investigadores e defensores de um sistema mais descentralizado. Ou seja, todos concordam (desde há muitos anos) com a obtenção de energia de produção fotovoltaica, mas não forma a ter impacto negativo nos ecossistemas e ocupar vastas áreas de território, incluindo reservas ecológicas ou agrícolas.

Por enquanto, a corrida de mega-parques solares em Portugal tem sido implementada de forma massiva. Cedida e monitorizada pela Direção-Geral de Energia e Geologia, a produção concentra-se no Alentejo e Algarve, onde o efeito do sol é mais forte e mais prolongado. Ao percorrer a auto-estrada rumo ao sul, é visível que a paisagem mudou nos últimos anos. No entanto, isto é só uma parte do que já está em curso. A maior central fotovoltaica da Europa, construída pelas empresas Prosolia e Iberdrolia em Santiago do Cacém, terá dois milhões de painéis solares. Vão afectar uma Reserva Ecológica Nacional (REN) e Reserva Agrícola Nacional (RAN). Isto significa que o impacto será nas zonas florestais e em terrenos agrícolas, com solos férteis e produtivos.

A maior central fotovoltaica da Europa, construída pelas empresas Prosolia e Iberdrolia em Santiago do Cacém, terá dois milhões de painéis solares

Mais a norte, entre o Cartaxo e Santarém, uma recente contestação revelou a intenção de abate de sobreiros para a instalação da produção de três centrais fotovoltaicas já existentes. Agora irão ocupar cerca de 500 hectares.

Na avalanche de pedidos de licenciamento para exploração de energia solar em grandes áreas, nem sempre a resposta da APA é positiva. Recentemente, o parecer para a implementação de 75 mil painéis solares numa área do Algarve, o equivalente a 160 campos de futebol, foi desfavorável.

Neste caso, o movimento de cidadania Pro Barrocal Algarvio contribuiu para o alerta, esclarecendo o impacto ambiental numa Reserva Ecológica Nacional, onde se encontra o aquífero de Peral-Moncarapacho. Outras entidades se manifestaram contra a construção desta central, e a Câmara Municipal de Tavira tomou uma posição desfavorável a este projecto.

Uma das preocupações, transversal a todo o Algarve porque afetaria outras zonas, é o impacto que este projecto teria na manutenção e proteção do aquífero. Mas não é só a questão da interferência nos recursos hídricos que preocupa as populações e os municípios. É também a perda de biodiversidade e a mudança da paisagem, que deixa de ser verde para ser uma superfície espelhada de grandes dimensões, onde a vida animais acaba por desaparecer e tornar a região desertificada.